21/11/2013 - Texto e Fotos: Thiago Moreno / Fonte: iCarros
O ano de 2013 está acabando. E a vida da Kombi também... As iluminações de Natal tomam os prédios e os membros do Sampa Kombi Clube, de São Paulo (SP), rodam com fitas pretas nos carros... Além de ser lembrado pelo ano em que os mensaleiros foram presos e que o Cruzeiro levou o Campeonato Brasileiro de futebol, dois mil e treze também encerra a produção da Kombi pela Volkswagen.
A Velha Senhora, após 56 anos de produção, se despede, vítima da regulamentação que exigirá airbags de série em todos os carros a partir de 2014. A Volkswagen tentou, mas a arquitetura do carro, datada da década de 1950, não permitiu a instalação dos equipamentos de segurança no carro, que saiu da linha montagem de São Bernardo do Campo (SP) pela primeira vez em 1957.
Saindo de cena sem perder a majestade
Apesar de a legislação ter colocado o último prego no caixão do primeiro carro fabricado pela Volkswagen no Brasil, a Kombi já estava encontrando dificuldades para acompanhar o atual mercado. Revolucionário na época de seu lançamento, o desenho fazia com que o motorista sentasse sobre o eixo dianteiro e, tão logo, transformava os joelhos dos passageiros numa espécie de segundo para-choque. E não era apenas este o problema. A direção da Kombi, inclinada como num ônibus, sempre teve uma folga crônica. Manter o carro em linha reta dá mais trabalho que fazer uma curva, pois são necessárias constantes correções de curso.
Quando foi a última vez que você viu uma propaganda da Kombi? Tirando uma despedida nas revistas e uma campanha “Não era você que queria um carro branco de três portas?” para brincar com os pomposos comerciais do Hyundai Veloster, a Velha Senhora era vista difícil nos comerciais. Mesmo assim, a Volkswagen vende mais de 2.000 unidades por mês há mais de uma década, sendo o furgão mais vendido do Brasil, segundo os dados da Fenabrave (Federação Nacional da Distribuição de Veículos Automotores).
Para entender essa dubiedade da Kombi, o iCarros testou uma unidade modelo 2013. A vocação para o trabalho era evidente: barro por baixo dos carpetes e um adesivo perdido no porta-luvas mostravam que o carro transportava os trabalhadores alocados nas obras de ampliação do aeroporto de Guarulhos (SP).
Dirigi-la é um ato de reaprendizagem. Não há assistência na direção nem ventilação forçada, a alavanca de câmbio tem quase um metro de comprimento. Sua melhor chance de se refrescar é com os quebra-ventos, lembram-se deles? Para piorar, a Kombi não é nenhuma pechincha. Custa R$ 50.930 na versão avaliada, com capacidade para nove passageiros. A furgão é oferecida por R$ 47.580.
O motor que empurra a Kombi foi introduzido em 2007, emprestado do Fox que era exportado para a Europa. Trata-se de um 1.4 flex com 80 cv de potência rodando com etanol e 78 cv com gasolina. Mais para cumpridor que para performático, o propulsor foi a principal evolução mecânica do carro desde o lançamento. Bicombustível e arrefecido à água eram termos que não existiam em 1957.
O câmbio é um caso a parte. Nas primeiras horas atrás do volante, não dá para entender como a Kombi ainda faz sucesso. Impreciso, com apenas quatro marchas, insiste em querer engatar a ré quando se passa da primeira para segunda. Cada troca exige um curso enorme entre as posições - e esforço do motorista. A direção é pesada demais, mesmo com o carro vazio, e seu diâmetro é incomum para os padrões atuais. O acabamento interno existe apenas na frente, onde as portas recebem um tampo de madeira e o teto tem uma forração que abriga luz interna retirada diretamente da segunda geração do Gol.
Depois de xingar, suar e até temer pela própria vida dentro do carro, ele começa a crescer em você. É estranho, mas é o que acontece. A Kombi te lembra que, um dia, o que ela entrega era tudo que se precisava para andar de carro. Tem espaço, leva uma tonelada de carga e/ou passageiros e não chove dentro. Pra quê mais que isso? A Kombi é aquela pulga atrás da orelha que te lembra o quanto fomos mimados pelos controles eletrônicos dos carros e que, não tem muito tempo, dirigir era mais uma questão de habilidade do que de vontade. Uma verdade inconveniente.
Os oito passageiros e o motorista têm espaço de sobra para pernas e cabeça, mais que muita van moderna. São 4,5 m de comprimento, 1,7 m de largura, 2 m de altura e 2,4 m de entre-eixos (a mesma medida do primeiro Fusca). Andar na Velha Senhora no caótico trânsito de São Paulo (SP), cercado por SUV’s blindados, chega a dar orgulho, pois você é um motorista melhor se conseguir domar as particularidades da Kombi.
Muitos comemoram o final da produção do carro e estão certos. A Kombi é errada sob qualquer aspecto de um carro produzido em 2013. É fácil entender isso. Difícil é compreender a majestade do carro que te levou pra escola, para praia, fez carreto, vendeu pastel na feira e que passou décadas ocupada demais trabalhando para se preocupar com atualizações. Vá com Deus, rainha...
As opções que ficam
Sem deixar herdeiros diretos na casa de São Bernardo do Campo (SP), a batalha pela coroa da Kombi como “pau pra toda obra” no mercado brasileiro ainda é um mistério, porque nenhum dos candidatos faz o que a Kombi sem fez sem esforço: levar muita coisa e muita gente ao mesmo tempo, com baixo custo de manutenção e farta oferta de peças.
No front chinês, Effa, Rely, CN Auto e Shineray têm nada menos que 12 opções de veículos diferentes, entre picapes, vans de passageiros e furgões. Os preços variam entre R$ 20 mil (para as picapes) e R$ 30 mil (para as vans). Entre os nacionais, a Fiat é a que chega mais perto. Com a Strada Working cabine dupla para quatro passageiros e carga na caçamba, mas em doses homeopáticas de ambos. A configuração custa R$ 42.330 e tem motor 1.4 flex de 86 cv com etanol. Usando o mesmo propulsor, o Doblò pode levar até sete passageiros (o sétimo assento é opcional) por R$ 54.334, mas não chega aos nove ocupantes como a Kombi.
Entre tantas e nenhuma opção para ficar com o legado da Kombi, o iCarros conheceu a Rely Link para analisar se a proposta atende às necessidades do público da Velha Senhora. A Link é o lançamento mais recente da marca de veículos comerciais controlada pela Chery e operada no Brasil pela empresa que fazia a importação dos modelos de passeio para cá antes de a companhia se nacionalizar. Esta van para oito passageiros com cara de desenho animado foi apresentada em setembro e custa R$ 47.990.
Oferecida em versão única, a Link tem motor 1.3 16V a gasolina de 83 cv acoplado a um câmbio manual de cinco marchas. Diferentemente de suas conterrâneas, com motor 1.0 e tração traseira, a Rely é mais moderna. De série, o carro traz direção hidráulica, ar-condicionado com saída para as fileiras traseiras, ABS, airbag duplo frontal, acionamento elétrico dos vidros dianteiros, espelhos e travas e rádio com entrada USB. Há uma segunda porta lateral corrediça, para facilitar o acesso. A Link consegue entregar uma evolução grande de projeto e equipamentos sem cobrar a mais por isso. O tamanho é uma delas, com 4 m de comprimento, 1,6 m de largura e 1,9 m de altura.
O motor dá conta do recado, mesmo com todos os assentos ocupados e, com a tração dianteira, o carro se mostra mais seguro em curvas, sem desgarrar ou adernar alarmantemente nas mudanças de direção. Até em velocidades altas, é perceptível o trabalho da marca para fazer o isolamento acústico funcionar. No documento da Link, consta “uso misto”. Ou seja, assim como na Kombi, você vai poder levar carga ou passageiros no mesmo carro. O único porém é que, enquanto os espaço para as cabeças é farto, para as pernas e para os ombros, é escasso.
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