28/03/2018 - Thiago Moreno, de Mogi-Guaçú (SP)/ Fotos: Thiago Moreno e Divulgação / Fonte: iCarros
Em 1964, a Ford lançou o seu carro mais icônico depois do Modelo T: era o Mustang, que nasceu com pretensões humildes, mas depois foi acumulando performance e foi astro de milhares de filmes. Sua chegada ao Brasil havia sido anunciada no final de 2017, décadas após o seu lançamento, e quem comprou o carro em pré-venda já está recebendo as primeiras unidades. A espera valeu a pena? Melhor valer, pois cada unidade custa ao menos R$ 299.990.
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Que Mustang é esse?
O carro que o Brasil está recebendo agora é o de sexta geração, mas já com o mais recente facelift. A questão é que todos os Mustang saem da mesma fábrica nos EUA, a de Flatrock, Michigan. Não importa para onde ele vai. O que vem para cá é similar ao europeu, com as lanternas traseiras translúcidas.
Em termos de versão, apenas a configuração GT Premium será trazida, equipada com o opcional Performance Pack. Assim, todos os Mustang brasileiros terão motor V8 e foco em performance.
Sob o capô ronca um V8
Em mercados mais maduros e mesmo nos EUA, você pode comprar um Mustang com motor de quatro ou seis cilindros V6, sendo que o primeiro é turbinado. Mas seja sincero: você compraria um Mustang por aqui se ele não fosse V8? Não, né? Foi o que eu pensei e concordo plenamente. Ficamos décadas sem Mustang e agora não queremos menos que o melhor que o esportivo da Ford tem a oferecer. E talvez esse seja o melhor Mustang da história.
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Como só a versão GT será vendida aqui, o motor embaixo do capô é um V8 5.0 aspirado e tem até nome: Coyote. Mas não pense que este é um daqueles V8 das antigas, preguiçoso e que em 4.000 rpm já está no limite. O Coyote chega ao limitador de giro em 7.500 rpm, o que é muito, considerando o tamanho, número de cilindros e a taxa de compressão relativamente alta de 12:1.
Assim o V8 entrega 466 cv de potência e 56,7 kgfm de torque, sendo que 82% da força é entregue a partir de 2.000 rpm, utilizando dupla injeção de combustível: direta e indireta. Vale ressaltar que o carro vendido no Brasil está homologado pela Ford para rodar com a nossa “gasolina” comum, sem restrições. De acordo com a marca, por aqui, o V8 entrega 6 cv a mais que o dos EUA por conta da adição de etanol no combustível.
Não é manual, mas como ficar bravo com um automático de 10 marchas?
Para os mais puristas, uma má notícia: apenas câmbio automático estará disponível para os brasileiros. Por um lado nem é tão ruim assim, já que se trata de uma transmissão com 10 marchas (sim, uma dezena de relações), das mais modernas oferecidas atualmente e que conta com aletas atrás do volante para trocas em modo manual. Ao menos a tração continua sendo traseira. E eu preciso repetir uma pergunta: você compraria um Mustang que não fosse tração traseira? Eu também não.
Já que é para ser caro, que traga tudo do bom e do melhor
Desde o lançamento da sexta geração que o Mustang deixou de ser apenas um clássico “pony car” americano com eixo rígido na traseira, como em um caminhão. Hoje, a suspensão traseira é independente e multi-link.
Como parte do pacote Performance Pack, os amortecedores são adaptativos com fluído magnético. Ao se modular uma correte elétrica por ele, o fluído enrijece, deixando a suspensão mais rígida. Assim você consegue um rodar confortável na estrada e com um acerto agressivo para a pista sem precisar trocar a suspensão, basta selecionar entre os modos de condução, ou deixar o carro fazer os acertos automaticamente.
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Os freios são da marca Brembo e não são pequenininhos não. Têm 380 mm de diâmetro, o que dá quase 15 polegadas. Ou seja, o Mustang tem mais disco de freio do que muitos carros têm de roda. E já que chegamos às rodas, as quatro são de liga leve com 19 polegadas de diâmetro, mas as dianteiras têm 9 polegadas de tala, enquanto as traseiras têm 9,5”. Os pneus são Michelin Pilot Sport 4S com medidas 255/40 na dianteira e 275/40 na traseira.
Entre os principais equipamentos de série, o Mustang vendido por aqui traz direção elétrica, ar-condicionado automático de duas zonas, revestimento parcial de couro para os bancos, ajuste de altura e profundidade para volante, ajuste elétrico do banco do motorista, sensores crepuscular e de chuva, chave presencial, faróis com lâmpadas de LED, sistema de som com 12 alto-falantes (contando um subwoofer de 8 polegadas no bagageiro), painel de instrumentos digital, seletor de modos de condução e central multimídia SYNC3 com espelhamento de smartphones via Android Auto e Apple CarPlay.
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Se tratando de um esportivo, a performance do Mustang é contrabalanceada por uma extensa lista de itens de segurança. Ele traz oito airbags (frontais, laterais, de cortina e para os joelhos), controle de estabilidade e tração, assistente de partida em rampa, câmera de ré, sensor de estacionamento traseiro, piloto automático adaptativo, alerta de colisão frontal com detecção de pedestres e frenagem autônoma, assistente de permanência em faixa e detector de fadiga.
Aos números
Nas medidas, o Ford Mustang tem 4,78 m de comprimento, 1,95 m de largura, 1,38 m de altura e 2,72 m de entre-eixos. O bagageiro não teve a capacidade declarada. Em ordem de marcha, o Mustang pesa 1.783 kg, sendo que a distribuição de peso é de 55% sobre o eixo dianteiro e 45% sobre o traseiro.
De acordo com a Ford, o Mustang GT vendido no Brasil acelera de 0 a 100 km/h em 4,3 segundos e tem velocidade máxima declarada de 250 km/h.
É tudo o que eu imaginava
“Será que vai ser tudo o que eu vi nos filmes?”, era tudo o que eu pensava no caminho para encontrar o novo Mustang. Bullit, Velozes & Furiosos e milhares de nomes famosos dos cinemas e séries ensinaram para nós, brasileiros, que o esportivo é a epítome da liberdade e rebeldia americanas. Daqueles que você precisa guiar durante o pôr do sol na Rota 66 escutando o melhor da música Country daquele país. Óculos aviador e chapéu de cowboy são diferenciais desejados.
Finalmente o dia chegou. Uma fila com cerca de 10 Mustang nos aguardava na porta do hotel rumo ao autódromo Velo Città, em Mogi Guaçu. Era uma fila de cores, dos tradicionais “branco, prata, preto, cinza” aos bem mais interessantes “Vermelho Vermont”, “Azul Belize” e “Laranja Daytona”. Escolhi o azul, que achei que ornava mais com as linhas do carro e, sob a luz do Sol, dava uma sensação de profundidade na cor. As rodas pretas ainda não me conquistaram, mas a Ford diz que oferecerá mais opções para os compradores.
Corri ao melhor estilo largada de Le Mans para o Mustang Azul Belize, antes que alguém o fizesse antes de mim. O que se seguiu foi uma sequência de partidas de V8 para fazer qualquer amante de carros chorar. Mesmo no modo de condução mais manso e acabando de “acordar”, o motor liga com um borbulhar grave, descompassado. Uma pisadinha de leve no acelerador só gera mais curiosidade para ver como fica o ronco na estrada.
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Saímos do hotel com as instruções usuais do percurso: “sigam o mapa, liguem os faróis, não usem o celular” etc; uma nem tão usual assim: “não desliguem o controle de tração”; e uma decepção: “a administração do autódromo não deixou usar o modo de arrancada”. O “Drag Mode” foca todos os esforços do Mustang para acelerar no quarto de milha (402 m) e permite travar os freios dianteiros para pré-aquecer os traseiros, para ter mais aderência. É “Burnout” que chama.
Saí no modo normal mesmo e vieram as primeiras surpresas: O Mustang não raspa o bico em valetas tão facilmente, como provado pela saída da rampa do hotel. Além disso, no modo para o dia a dia, o acelerador é um tanto arisco e o V8 ronca bonito mesmo andando devagar e no modo mais silencioso. Fica um destaque para os freios, firmes, mas começam a parar as quase duas toneladas do carro com um mínimo de pressão sobre o pedal.
Há outros modos, como o Neve/chuva, para situações de baixíssima aderência, Sport e Sport+ (autoexplicativos), Pista e Arrancada. Do primeiro ao último, vão-se agilizando as trocas de marcha e respostas do acelerador, dá-se mais peso ao volante e os controles de tração e estabilidade intervêm menos. Há um modo individual, em que o motorista pré-define os parâmetros de respostas e controles.
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Mas o mais importante: o ronco do escape aumenta de volume. E não é qualquer escape. Do motor ao último abafador usa-se tubulação de 2,5”, enquanto a saída de duas ponteiras duplas tem, cada, 3,5”. E quanto aumenta o volume? O suficiente para a Ford achar necessário ter uma função no computador de bordo que programa horários em que o V8 não pode ligar com escapamento no volume máximo. Particularmente, não vejo problemas em acordar alguns vizinhos e disparar alguns alarmes se eu tivesse um Mustang.
No começo da viagem, uma breve circulada entre os modos, só para ver o que acontece e acontece o esperado. Do Sport+ pra cima, é altamente recomendável uma pista fechada. Como eu sei é um segredo que levarei comigo para o caixão.
O trajeto saía de Indaiatuba (SP) em um trecho mesclando estradas menores e um pequeno pedaço da Rodovia dos Bandeirantes, finalizando pela Rodovia Governador Adhemar de Barros, com duas faixas em cada mão e limites variando entre 90 km/h e 110 km/h. Aí preciso tirar uma informação chata, mas útil, da frente: nesse ritmo o Mustang cravou 10,5 km/l de consumo. Nada mal.
No primeiro trecho, urbano e com estradas pequenas, não era lugar para acelerar de qualquer forma. Mas a mescla do V8 ronronando sob o capô e o conforto da suspensão adaptativa criaram uma experiência que não esperava. Carro esportivo bom não pode divertir apenas quando está correndo. Tem que ser legal a qualquer velocidade.
E o Mustang faz isso com maestria. Desliguei o ar-condicionado, abaixei os vidros, apoiei o braço na porta e ouvi a melhor seleção de country que os aplicativos de música tinham a disposição. Andar nas "highways" americanas deve ser uma sensação muito parecida.
Finalmente a estrada abriu e com ela apareceu o primeiro pedágio. Os carros estavam ainda relativamente juntos e formaram duas pistas paralelas. As cancelas abriam e os Mustang pareciam partir para o quarto de milha, com o ronco do V8 preenchendo o espaço ao redor a mais de 400 m de distância. Cena linda de se ver.
Foi a primeira oportunidade que tive de testar a aceleração do carro. De novo: tudo o que esperava. Aumentei o volume do Hank Williams, Jr. no som (que é de ótima qualidade, diga-se de passagem) e dei pé ao som do banjo. Se for lhe dada a oportunidade para isso, agarre e aproveite. É viciante e preenchido por adrenalina. O V8 Coyote girando até o limite de 7.500 rpm foi o mais perto que cheguei da Nascar, a Stock Car americana.
Aí percebi que havia cometido um erro: arranquei com o carro no modo mais normal possível. Só uma coisa me veio na cabeça: “Jesus, imagina esse negócio no modo pista”. E para a pista nos encaminhávamos.
No meio do caminho, acabei “errando por acidente” a hora de sair da Bandeirantes e tive que fazer o retorno 20 km depois, acrescentando 40 km ao trajeto original. Uma pena. O retorno em si permitiu mais duas experiências. Primeiro, os buracos. No modo “civil”, parecia mais um Fusion absorvendo as imperfeições que um esportivo. Havia também um túnel, onde, sem querer, esbarrei na alavanca de câmbio, que foi para neutro e acelerei pensando estar engatado. O Mustang não mexeu. Digo, as portas, vidros e meus tímpanos vibraram bastante. Tomem cuidado para não passar pela mesma experiência.
Chegavam os últimos momentos atrás do volante do Mustang e já começava a bater uma saudade. Tanto do conforto que não esperava, quanto do alto índice de “sorrisos por quilômetro rodado” providos pelo V8. Sol na cara, música country no rádio, V8 roncando... lindo. Até mesmo o câmbio automático encaixa bem no cenário. Rápido, suave e, em modo manual, ele não troca de marchas sozinho ao chegar no limitador de giro. Ele deixa cortar para te mostrar que você errou, como deveria ser em qualquer carro. Errando que se aprende.
Era a hora da minha dupla assumir o volante. No banco do passageiro finalmente pude ver acabamento, espaço interno, todos esses itens nem tão emocionantes assim. O design do painel é dos mais clássicos, com uma “dupla asa” à frente do motorista e do passageiro, como é tradição desde 1964. Há uma plaqueta “Mustang” no lado do passageiro, caso você tenha esquecido em qual carro está.
O acabamento tem dois materiais básicos: emborrachado e couro. Os bancos são confortáveis e apoiam bem o motorista tanto para longos trajetos quanto na pista, sem deixar o corpo rolar para os lados. O mais interessante é que faz isso sem ser duro. O espaço traseiro é dos menores, mas há duas fixações Isofix. Nesse momento, de carona, a facilidade de uso do sistema SYNC 3 agrada. Além de vários outros itens, como os bancos ventilados, que vão bem nos dias de verão.
Percebi o colega dando as primeiras aceleradas, para sentir o carro. No alto de minha experiência de uma hora no Mustang, recomendei que ele diminuísse o ritmo e reduzisse até a segunda marcha, para poder acelerar sem ultrapassar o limite da estrada. E lá foi o V8 cantar a 7.500 rpm com dois jornalistas rindo que nem bobos dentro.
Finalmente chegamos à pista, onde a apresentação formal aconteceu. Vimos toda a tecnologia embarcada do carro e até o papel da engenharia brasileira no Mustang. Conferimos alguns concorrentes e faixas de preço. O que guardei dessa parte é que a Ford trabalhou duro para que seu esportivo mais clássico tivesse os níveis de perfomance mais atuais e atendesse a todas as exigências de segurança e emissões. Trabalhou mais duro para ter certeza que o novo Mustang não fosse diferente dos antigos quando o assunto é experiência. Ainda é um V8, graças a Deus.
Não sou piloto de corrida, nunca fui, nem pretendo. Andei com o Mustang no autódromo dentro do que eu podia fazer, mas desfiz uma dúvida que estava me comendo por dentro. Um motor que gira muito costuma ser fraco em baixa. Um V8 torcudo de baixa, por outro lado, perde o fôlego em alta. Onde o Coyote da Ford se encaixaria nessa fila do pão?
Saída de curva, deixei a rotação cair para 1.000 rpm, acelerei tudo com o câmbio no modo manual para não ter reduções intrometidas de marcha em meu experimento científico. Posso dizer agora que o Mustang não tem nem um motor girador de corrida, nem um V8 preguiçoso. Tem os dois. Ele não tem a pancada de carros exóticos turbo com 1.000 cv de potência, mas parece que tem uma mão invisível te empurrando constantemente para frente até o limitador.
Depois foi nos dada uma chance de fazer uma volta rápida com um piloto profissional ao volante. Se tinha uma hora melhor que essa para ver a tração traseira provocar um sobre-esterço e uma nuvem de fumaça, não conhecia. Aí veio a última surpresa do dia. O Mustang gruda nas curvas, só gruda. Ele embica na entrada e contorna. Com alguém que sabe o que está fazendo, não rola, não roda nem escapa de traseira.
Os pneus Michelin Pilot Sport 4S merecem mérito, mas não emitiram um ruído sequer durante a volta. A suspensão adaptativa que a Ford colocou no Mustang vendido aqui realmente consegue unir conforto e performance.
Fim do dia, tive que assistir todos os Mustang do teste subindo em uma cegonheira, enquanto embarcava em uma bem mais humilde (mas ainda tração traseira) Ford Transit. Triste e feliz ao mesmo tempo.
Triste porque esses Mustang precisam rodar livres na estrada, onde é o lugar deles, não pegando carona em um caminhão. Livres que nem a raça de cavalos que inspirou o nome do esportivo. Feliz porque, pelo menos uma vez, os filmes de Hollywood não mentiram. O Mustang tem uma experiência tão envolvente e te deixa tão feliz dirigindo como em qualquer filme antigo. E isso é algo novo para nós brasileiros, que tínhamos muitas expectativas após décadas de espera.
O Mustang é tudo o que eu esperava. Vou guardar sempre na memória o Sol, a estrada, o vento com os vidros baixados e o ronco suave do V8 borbulhando por aí. Se você gosta de carros, como eu, e tem R$ 300 mil para comprar um Mustang, diferentemente de mim, é quase um sonho se realizando. E sonho não tem preço.
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